Coração recuperado
 



 
Célula tronco já aprovada

Muita vida pela frente! Vida recuperada, reconquistada. A dona de casa Maria Aparecida Franco esteve no Instituto do Coração (Incor ), em São Paulo, só para mais um exame de rotina. Mas até aquele dia chegar, estava difícil viver. "Eu estava cansadíssima, já não era mais nada. Eu era enorme de rosto, de tudo. Estava inchada e esperando o final. Eles diziam que não tinha outra chance para mim", conta ela.

Nem os 16 comprimidos que tomava por dia ajudavam. Com várias artérias entupidas, parte do coração de dona Maria Aparecida não recebia sangue. Ela estava perdendo as forças, e os recursos da medicina chegaram ao limite.

"Ela tinha, por exemplo, uma artéria coronária totalmente obstruída. Em situação convencional, ela receberia ponte de safena onde fosse possível e aquela região ficaria descoberta, não seria tratada", diz o cardiologista do Incor Luis Henrique Gowdak.

Mas já pode ser – e com células-tronco. O Incor é um dos primeiros hospitais brasileiros a usá-las para recuperar o coração de quem sofre infartos e anginas. Durante a cirurgia convencional de ponte de safena, os médicos usam seringas para retirar células-tronco da medula óssea na bacia do paciente. Depois de separadas no laboratório, elas voltam para a sala de operação e são injetadas direto no coração. No órgão de dona Maria, o resultado é visível.

"No momento pré-operatório, nós vimos várias áreas onde não existia circulação sanguínea. E nós temos um segmento pós-operatório, onde vemos praticamente a normalização da circulação sanguínea”, revela o cardiologista.

Sangue correndo nas veias e coração batendo forte de novo. "Faço caminhada, subo escada, limpo casa, lavo louça, faço comida, durmo de bruços e comecei a amar de novo. O coração está ótimo. Eu sinto vida, eu tenho paz, tenho alegria", comemora Maria Aparecida.

Outra Maria, no Rio de Janeiro, também escreveu o nome na história da medicina. Foi depois de um derrame. "Ela não ia recuperar o movimento das pernas, nem dos braços e não ia voltar a falar. No dia seguinte eu já estava me preparando para arrumar uma cadeira de rodas para ela, porque ela ia ter alta”, conta Márcio da Costa, filho da paciente.

Antes de ter alta, dona Maria da Pomacena virou notícia: foi a primeira vítima de derrame no mundo a receber células-tronco no cérebro. Elas também são tiradas da medula óssea da bacia e injetadas por cateter até o local da lesão. Sete dias depois, os exames mostravam brilho intenso na área que estava morta no cérebro.

"A interpretação que nós estamos fazendo é que as células de medula óssea que foram injetadas através da artéria cerebral média se depositaram preferencialmente na região lesada e essas células estão tendo uma atividade metabólica maior do que as do restante do cérebro", explica a pesquisadora Rosália Mendez Otero, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Os médicos sabem que quem sofre um derrame pode até se recuperar naturalmente. Mas a surpresa desta primeira experiência está na rapidez e na ação intensa das células injetadas no cérebro.

Novas pesquisas serão feitas com pacientes que acabaram de sofrer lesão grave na coluna, com outras vítimas de derrame, infarto e doenças incuráveis, como a de Isaac. Há 11 dias ele foi o primeiro brasileiro vítima de esclerose lateral amiotrófica (ELA) a fazer o tratamento com células-tronco. Está vivo e com esperança de que a doença pelo menos estacione, pare de destruir os músculos.

"Todo dia há pacientes para os quais nós olhamos e sentimos que somos impotentes no sentido de oferecer alguma coisa útil para eles. Então, essa também poderá ser uma nova etapa. É possível que a gente tenha uma nova arma", comenta Sérgio Oliveira, diretor da Divisão Cirúrgica do Incor.